Fagocitose

Eu fiquei observando disfarçadamente aquele casal que já conheço de muito tempo, tão próximos um do outro e de mãos entrelaçadas, enquanto todos conversavam no grande grupo de pessoas em volta da mesa com doces, bebidas e salgados. Eles pareciam retratar a equilibrada relação que todos esperam de um casamento, uma cumplicidade de gestos e olhares, sem qualquer expressão  de reprovação ao que o outro falava. A resposta de um, parecia a permissividade silenciosa do outro que finalizava tudo  numa ideia unilateral, de simetria cuidadosa. 
As frases pareciam consentidas, pré aprovadas, politicamente corretas, equilibradas nas normas que envolvem o enlace e suas regras do bem viver a dois.  
Não pareciam dois indivíduos com pensamentos independentes, mas uma só pessoa, uma única personalidade em dois corpos com liberdade de movimentos, ligados a um fio condutor de regras incorporadas e com mesmo enfoque de pensamentos, de ideias morais, de opiniões que se combinam perfeitamente.  
Falar com um, dava a sensação de se falar com o outro, um eco da mesma voz; Uma espécie de instituição organizada, uma célula fagocitada, que parecia suprimir as diferenças  existentes entre as personalidades, que sabe-se, são diferentes entre si por natureza.  
Enfim.., faltava-lhes naturalidade, as dobras que não se encaixam, as pequenas diferenças que faz tudo parecer naturalmente normal.
Diante de tanta perfeição, me senti o mais imperfeito dos convidados presentes!

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